segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

João e Maria

Valor R$ 14,00
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Da tradição oral

Às margens de uma floresta existia, há muitotempo, uma cabana pobre feita de troncos de árvores, onde moravamum lenhador, sua segunda esposa e seus dois filhinhos, nascidos doprimeiro casamento. O garoto chamava-se João e a menina, Maria.Na casa do lenhador, a vida sempre fora difícil, mas, naquelaépoca, as coisas pioraram: não havia pão para todos.— Mulher, o que será de nós? Acabaremos morrendo de fome. Eas crianças serão as primeiras.— Há uma solução... – disse a madrasta, que eramuito malvada – amanhã daremos a João e Maria um pedaço depão, depois os levaremos à mata e lá os abandonaremos.O lenhador não queria nem ouvir um plano tão cruel, mas a mulher,esperta e insistente, conseguiu convencê-lo.No aposento ao lado, as duas crianças tinham escutado tudo, eMaria desatou a chorar.— E agora, João? Sozinhos na mata, vamos nos perder emorrer.— Não chore — tranqüilizou o irmão. — Tenhouma idéia.Esperou que os pais estivessem dormindo, saiu da cabana, catou umpunhado de pedrinhas brancas que brilhavam ao clarão da Lua e asescondeu no bolso. Depois voltou para a cama. No dia seguinte, aoamanhecer, a madrasta acordou as crianças.— Vamos cortar lenha na mata. Este pão é para vocês.Partiram os quatro. O lenhador e a mulher na frente, as criançasatrás. A cada dez passos, João deixava cair no chão uma pedrinhabranca, sem que ninguém percebesse. Quando chegaram bem no meio damata, a madrasta disse:-— João e Maria, descansem enquanto nós vamos rachar lenhapara a lareira. Mais tarde passaremos para pegar vocês.Os dois irmãos, após longa espera, comeram o pão e, cansados efracos, adormeceram. Acordaram à noite, e nem sinal dos pais.— Estamos perdidos! Nunca mais encontraremos o caminho decasa! — soluçou Maria.— Quando a Lua aparecer no céu acharemos o caminho de casa— consolou-a o irmão.Quando a Lua apareceu, as pedrinhas que João tinha deixado cairpelo atalho começaram a brilhar, e, seguindo-as, os irmãosconseguiram voltar à cabana.Ao vê-los, os pais ficaram espantados. O lenhador, em seu íntimo,estava contente, mas a mulher não. Assim que foram deitar, disseque precisavam tentar novamente, com o mesmo plano. João, que tudoescutara, quis sair à procura de outras pedrinhas, mas não pôde,pois a madrasta trancara a porta. Maria estava desesperada.— Como poderemos nos salvar desta vez?— Daremos um jeito, você vai ver.Na madrugada do dia seguinte, a madrasta acordou as crianças eforam novamente para a mata. Enquanto caminhavam, Joãozinhoesfarelou todo o seu pão e o da irmã, fazendo uma trilha. Destavez afastaram-se ainda mais de casa e, chegando a uma clareira, ospais deixaram as crianças com a desculpa de cortar lenha,abandonando-as.João e Maria adormeceram, famintos e cansados. Quando acordaram,estava muito escuro, e Maria desatou a chorar.Mas desta vez não conseguiram encontrar o caminho: os pássaroshaviam comido todas as migalhas. Andaram a noite toda e o diaseguinte inteirinho, sem conseguir sair daquela floresta, eestavam com muita fome. De repente, viram uma casinha muitomimosa. Aproximaram-se, curiosos, e viram, encantados, que otelhado era feito de chocolate, as paredes de bolo e as janelas dejujuba.— Viva!— gritou João. E correu para morder uma parte do telhado, enquanto Mariazinhaenchia a boca de bolo, rindo. Ouviu-se então uma vozinha aguda,gritando no interior da casinha:— Quem está o teto mordiscando e as paredes roendo?As crianças, pensando que a voz era de uma menina de sua idade,responderam:— É o Saci-pererê que está zombando de você!Subitamente, abriu-se a porta da casinha e saiu uma velha muitofeia, mancando, apoiada em uma muleta. João e Maria se assustaram,mas a velha sorriu, mostrando a boca desdentada.— Não tenham medo, crianças. Vejo que têm fome, a pontode quase destruir a casa. Entrem, vou preparar uma jantinha.O jantar foi delicioso, e a velha senhora ajeitou gostosascaminhas macias para João e Maria, que adormeceram felizes. Nãosabiam, os coitadinhos, que a velha era uma bruxa que comiacrianças e, para atraí-las, tinha construído uma casinha de doces.Agora ela esfregava as mãos, satisfeita.— Estão em meu poder, não podem me escapar. Porém estão umpouco magros. É preciso fazer alguma coisa.Na manhã seguinte, enquanto ainda estavam dormindo, a bruxaagarrou João e o prendeu em um porão escuro, depois, com umasacudida, acordou Maria.— De pé, preguiçosa! Vá tirar água do poço, acenda o fogoe apronte uma boa refeição para seu irmão. Ele está fechado noporão e tem de engordar bastante. Quando chegar no ponto voucomê-lo.Mariazinha chorou e se desesperou, mas foi obrigada a obedecer.Cada dia cozinhava para o irmão os melhores quitutes. E também, acada manhã, a bruxa ia ao porão e, por ter vista fraca e nãoenxergar bem, mandava:— João, dê-me seu dedo, quero sentir se já engordou!Mas o esperto João, em vez de um dedo, estendia-lhe um ossinho defrango. A bruxa zangava-se, pois apesar do que comia, o molequeestava cada vez mais magro! Um dia perdeu a paciência.— Maria, amanhã acenda o fogo logo cedo e coloque águapara ferver. Magro ou gordo, pretendo comer seu irmão. Venhoesperando isso há muito tempo!A menina chorou, suplicou, implorou, em vão. A bruxa seaborrecera de tanto esperar.Na manhã seguinte, Maria tratou de colocar no fogo o caldeirãocheio de água, enquanto a bruxa estava ocupada em acender o fornopara assar o pão. Na verdade ela queria assar a pobre Mariazinha,e do João faria cozido.Quando o forno estava bem quente, a bruxa disse à menina:— Entre ali e veja se a temperatura está boa para assarpão.Mas Maria, que desconfiava sempre da bruxa, não caiu naarmadilha.— Como se entra no forno? — perguntou ingenuamente.— Você é mesmo uma boba! Olhe para mim! — e enfioua cabeça dentro do forno. Maria empurrou a bruxa para dentro do forno e fechou a portinholacom a corrente. A malvada queimou até o último osso.A menina correu para o porão e libertou o irmão. Abraçaram-se,chorando lágrimas de alegria; depois, nada mais tendo a temer,exploraram a casa da bruxa. E quantas coisas acharam! Cofres emais cofres cheios de pedras preciosas, de pérolas...Encheram os bolsos de pérolas. Maria fez uma trouxinha com seuaventalzinho, e a encheu com diamantes, rubis e esmeraldas.Deixaram a casa da feiticeira e avançaram pela mata.Andaram muito. Depois de algum tempo, chegaram a uma clareira, eperceberam que conheciam aquele lugar. Certa vez tinham apanhadolenha ali, de outra vez tinham ido colher mel naquelas árvores...Finalmente, avistaram a cabana de seu pai. Começaram a corrernaquela direção, escancararam a porta e caíram nos braços dolenhador que, assustado, não sabia se ria ou chorava.Quantos remorsos o tinham atormentado desde que abandonara osfilhos na mata! Quantos sonhos horríveis tinham perturbado suasnoites! Cada porção de pão que comia ficava atravessada nagarganta. Única sorte, a madrasta ruim, que o obrigara a livrar-sedos filhos, já tinha morrido.João esvaziou os bolsos, retirando as pérolas que havia guardado;Maria desamarrou o aventalzinho e deixou cair ao chão a chuva depedras preciosas. Agora, já não precisariam temer nem miséria nemcarestia. E assim, desde aquele dia o lenhador e seus filhosviveram na fartura, sem mais nenhuma preocupação.

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